Ondas - Parte I "Génesis"

Por Bruno Lampreia in SURFPortugal revista #230 de Março de 2012. 



É um fenómeno rodeado de mistério para muitos, geralmente aceita-se de bom grado as ondas que o oceano nos oferece, sem sequer pararmos para pensar na origem daquela onda que nos fez ganhar o dia. Este texto é a primeira parte de três, onde iremos dissecar o que gera as nossas ondas em Portugal. Aqui analisamos o princípio de tudo, A GÉNESE. 

A máquina que gera tempestades 

É, em grande maioria, na costa Leste dos Estados Unidos da América, que se começam a formar as baixas pressões que nos vão influenciar, a massa de ar que atravessou o norte daquele continente irá agora receber humidade e calor, proveniente da corrente do Norte Atlântico, vinda da zona equatorial.

  Este aquecimento da atmosfera, ocorre numa área de separação de ar quente, proveniente de latitudes mais baixas e de ar frio, originário no Pólo Norte. Isto confere-lhe um choque térmico, que com humidade á mistura (e a sempre presente força de coriolis) irá formar frentes e um movimento de rotação, no sentido oposto aos ponteiros do relógio, em torno da baixa pressão.

Existe ainda outro fator a ter em consideração, que dita o percurso e a intensificação destas áreas tempestivas, pois ao encontrarem-se numa zona de separação, entre uma massa de ar quente e outra de ar frio, a nossa Baixa Pressão ocorre numa descontinuidade que possui um corredor de vento muito intenso em altitude. Denominada de corrente de jato, é responsável por imprimir mais rotação à tempestade, bem como retirar-lhe ar em altitude, o que a obriga a sugar mais ar à superfície, sendo que desta forma intensifica-se.

São estas depressões que após atravessarem o Atlântico Norte, na sua deslocação de Oeste para Leste, provocam mau tempo nas costas viradas a Oeste na Europa.

A tempestade perfeita

Situemo-nos agora no interior da nossa depressão, onde o temporal e ventos intensos se fazem sentir. Nesta área em que o vento forte está em contato com o mar existe todo um conjunto de movimentos turbulentos, água projetada no ar, espuma branca, ondas a quebrarem e todo um conjunto de ondulação indefinido, retratando um estado de mar caótico.

Quanto mais cavada for a baixa pressão, isto é com valores bastante baixos de pressão e isóbaras muito apertadas, teremos uma tempestade mais ativa, com mais vento e consequentemente o mar refletirá essas condições. Até porque o ar em movimento encontra-se mecanicamente a interagir com a superfície oceânica, deformando-a e originando vagas.

Dissecando o mar caótico 

Nesta miscelânea de ondas com diferentes, alturas, comprimentos e períodos, é difícil de acreditar que é isto que pode gerar uma ondulação perfeita numa praia.

A única forma de entendermos o que está a acontecer no mar é separar onda por onda, pelas suas características, período, altura e comprimento. Parece que tudo ocorre ao mesmo tempo, estas ondulações interagem entre si de formas construtivas e destrutivas, isto é, quando várias cristas de onda coincidem num mesmo local, resultam numa onda composta por várias ondas somadas, ao que chamamos interferência construtiva. Gerando assim uma onda maior que todas as observadas até então. Dando origem, por vezes às “Rogue waves”, conhecidas por sepultarem barcos em alto mar. 

Quando é a crista de uma onda a coincidir com o ponto mais baixo de outra (vale), o conjunto resulta numa onda significativamente mais pequena, das que deram origem a esta, temos assim a interferência destrutiva.

Ingredientes para uma boa receita 

Para que esta tempestade, ainda bem longe do nosso país, gere uma boa onda na nossa praia, falta-nos ainda considerar quatro ingredientes, a velocidade do vento, a sua duração, tamanho da área afetada e o estado do mar. 

De uma forma simples, quanto maior a intensidade do vento, maior o período, comprimento e altura das ondas, desde que este sopre de uma forma constante durante um período de tempo considerável. 

Este vento tem também de abranger uma boa área oceânica, isto para que o seu crescimento continue a ser alimentado ao longo do seu percurso. O estado do mar presente dita se a nossa ondulação dentro da tempestade crescerá conforme previsto, pois se a superfície do mar se encontrar suave e desprovida de grandes ondulações promove-se a continuação do crescimento das ondas, pelo contrário, se a zona por onde a tempestade irá progredir já se encontrar com um mar revolto, haverá uma superfície irregular a atenuar toda a geração de ondulação.

A busca pelo Santo Graal

Em suma quando um surfista já busca o Swell ideal muito para além dos registos das boias, ou de uma simples previsão de tabela, tem mais probabilidades de ter um dia realmente clássico, pois acompanhou a evolução das condições a reunirem-se desde a sua génese. E se esta revista é a bíblia do surf, então este texto retrata o génesis do surf, onde tudo começa e continuaremos na próxima edição a busca pelo santo graal do surf… O Swell ideal!